Referência nacional em preservação histórica do cinema, a Mostra CineOP levanta a urgência de falar sobre a memória do audiovisual

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Longas-metragens, curtas, peças audiovisuais para a TV: todos esses materiais têm algo em comum. São produzidos com objetivos específicos diversos mas convergem no fato de que, após colocados em circulação, tornam-se documentos históricos sobre uma determinada época, seja do ponto de vista da opção estética ou em relação ao que sua narrativa diz sobre o contexto social e político em que foi realizado.

Com tudo isso em vista, quem se interessa por cinema, deve ficar atento aos caminhos possíveis para a preservação história do audiovisual brasileiro, viabilizada a partir de órgãos específicos, como o Setor de Comunicação da Unesco, as Cinematecas espalhadas por todo o país e eventos que focalizem o tema. E tem coisa boa vindo aí!

A memória do cinema nacional ganhará, na próxima semana de junho, um momento de projeção, homenagem e, principalmente, de reflexão sobre a importância da preservação. Isso porque será realizada entre os dias 22 e 27 a 11ª edição da Mostra CineOP, que reúne 91 produções audiovisuais realizadas no Brasil, incluindo longas-metragens, curtas e produções realizadas em contexto escolar. Tudo isso sob o eixo temático Cinema, TV e Educação, considerando o período da Abertura Política brasileira, que vai de 1976 até o ano de criação da Nova Constituição, em 1988.

Francis Vogner, curador da CineOP e crítico de cinema, explica, que a escolha do tema vai de encontro com o momento político que o Brasil enfrenta, que, segundo ele, é parte derradeira de um processo que se iniciou com a democratização. “Naquele momento, surgiu o novo sistema e nova classe política, processo que chega ao fim com a atual crise. Neste sentido, a importância de debater a produção cinematográfica brasileira do período de abertura política é para que possamos tentar compreender como o cinema entendeu esse novo Brasil que surgia, um Brasil que está chegando ao fim agora”.

E como toda história também é feita de nossa memória recente, o festival vai exibir, na Mostra Educação produções sobre as ocupações dos secundaristas nas escolas de São Paulo, como o documentário em longa-metragem Acabou a paz, isto aqui vai virar o Chile – Escolas ocupadas em São Paulo, dirigido por Carlos Pronzato. O filme retrata o levante dos estudantes paulistas no segundo semestre de 2015 contra o fechamento de 94 escolas, que culminou na ocupação de mais de 200 unidades de ensino. A coragem dos secundaristas paulistas, inspirados no exemplo dos estudantes secundaristas chilenos, os famosos Pinguins, deixou sua marca na história das lutas populares do Brasil.

A edição deste ano vai prestar uma homenagem ao cineasta Eduardo Coutinho, colocando a público algumas de suas obras mais célebres e que melhor contribuem para esboçar um panorama do audiovisual do período, como Cabra Marcado pra Morrer (1984), e os mais recentes Jogo de Cena (2007) e Últimas Conversas (2015).

O passado como vitrine do presente

O Festival chama a atenção para a urgência de valorizar os arquivos audiovisuais como peças-chave da formação de identidade de um país, e mostra que nem só de catalogação e novas tecnologias de preservação é feita uma ação de preservação cultural. Curadorias em torno da produção de uma determinada época também são fundamentais quando se quer resgatar e resguardar a narrativa de um período histórico.

 “Olhar para o passado para compreender o presente e pensar no futuro”, este é o mote da Mostra CineOP. Francis Vogner, explica que a relação de um povo com o passado determina de maneira muito forte o que ele espera do futuro. “Repetir o passado não é possível, precisamos aprender com a história”, afirma o curador, que complementa relacionando a preservação da memória com a valorização da criatividade cultural. “Nossa cultura política tem muito anseio pelo futuro e ao mesmo tempo um desprezo pelo passado. A CineOP busca se relacionar com o passado para elaborar uma perspectiva de futuro. Estamos tentando criar proposições para um país onde a cultura, a educação e a memória foram os primeiros a serem atingidos nesta atual crise política”.

A partir dos filmes e dos debates que serão promovidos após as exibições, tudo organizado com a preocupação de reunir abordagens que refletissem como o cinema da época sentiu e pensou o processo de democratização e seus efeitos para a cultura, o público poderá ter uma dimensão histórica, social e política do cenário audiovisual dos anos 70 e 80. Assim, clássicos da cinematografia brasileira serão postos lado a lado, como páginas de uma história que precisa ser revisitada. Entre os títulos, estão Eles não usam Black Tie, de Leon Hirszman (1981) e A Próxima Vítima, de João Batista de Andrade (1983), que fazem uma avaliação mais direta do período político em questão. Já o longa Extremos do Prazer, de Carlos Reichenbach (1983), tentava entender a experiência de uma juventude, filhos da ditadura; o média Superoutro, de Edgard Navarro (1989) é uma perspectiva tardia da contracultura frente a falta de horizonte político num período de pós-ditadura e, por fim, um filme que exemplifica bem o processo dessa Nova República pós-constituinte é Festa, de Ugo Giorgetti (1989).

Para reunir os filmes em segmentos temáticos, o festival dividirá as produções em 13 mostras: Educação, Contemporânea, Preservação, Homenagem, Histórica e Praça, para longas e médias, e as Mostras Preservação, Histórica, Praça, Venturas, Mostrinha e Horizontes para curtas-metragens. Os filmes vêm de 12 Estados diferentes e representam diversas expressões da produção cinematográfica brasileira, em diferentes formatos e épocas.

Com o cuidado de explorar o olhar para o passado a partir de diferentes plataformas, a Mostra temática Preservação vai refletir sobre o acesso e a preservação de Arquivos de Televisão. Um dos destaques deste eixo temático é o documentário Jango (1984), de Silvio Tendler.

Para viabilizar tudo isso, serão seis dias de programação gratuita, 34 sessões de cinema com exibição de 19 longas, sete médias e 65 curtas espalhados por espaços diversos da cidade de Ouro Preto, como Praça Tiradentes, Cine Vila Rica e Centro de Convenções.


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