O SUMIÇO DAS ABELHAS

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28 de julho de 2014
JORNAL “A GAZETA”
Caderno 2


Um dia, o escritor Lezama Lima mostrou como os objetos de uma vitrine têm misteriosas interações que os ligam, combinam ou destroem. Penso nisso, quando leio a notícia de que as criaturas da Terra estão entrando em uma  fase de extinção periódica. Várias espécies animais já desapareceram ou estão ameaçadas de desaparecimento total. Tal como  os dinossauros, há 65 milhões de anos atrás. Assim, o que era para ser uma adorável esfera azul girando em torno de uma estrela perdida pela imensidão do infinito, pode se tornar, de repente, uma bola infernal, pior de que aquela espiral imaginada por Dante.
            Não é de modo inocente que essa tragédia ecológica acontece. E, dessa vez, como é costume nos dramas policiais, o culpado é mesmo o mordomo. Sim. Porque ser apenas mordomo é a função do bípede vertebrado que, pretensiosamente, se acha o mais inteligente entre os seres marinhos, aéreos e terrestres. Um ínfimo mordomo, incapaz de mudar as leis dos deuses do Cosmos, mas capaz de ligar, combinar e destruir a harmonia dessa imensa vitrine que é o planeta.
É dos seres humanos que estou falando. E um dos sintomas mais graves da péssima gerência humana é o sumiço das abelhas.  
Para além das simpáticas representações em imagens que, de modo milenar, as elegem como modelos graciosos de habilidade e propagação, desde as artes e ofícios até à cultura de massa (como prova a abertura da novela “Geração Brasil”, da Globo), as abelhas são criaturinha essenciais para a existência da Terra. Não só pelo mel, a substância dourada, ou pela própolis, o antibiótico mais natural, ou pela geleia real, o supra sumo de todos os demais alimentos. Mas também pela atividade de fecundação de 80% do meio vegetal ambiente que elas revitalizam de modo incansável, em seu vai e vem carregado de pólen.
No entanto, as abelhas estão desaparecendo! Colônias inteiras se vão, a cada instante, no mundo. Ninguém sabe para onde. As rainhas  evanescem. As operárias somem sem deixar vestígios. E nenhum cadáver é achado. Cientistas se indagam sobre esse intrigante mistério. E parece que agora se descobre que as mudanças ambientais são mesmo a razão dessa coisa terrível. Ou seja, o assassino é o excesso de produtos químicos, usados pelos agricultores para proteger plantações. Cheio de pesticidas, o sistema imunológico das abelhas fica vulnerável e é  corroído, estando sujeito ao ataque de ácaros, vírus e fungos. No arsenal desses “vampiros de abelhas” se destaca o Varroa, um parasita que pode ser chamado de “O exterminador do futuro”.
A agricultura seletiva e intensiva que vai rarificando as variedades  de plantas nos campos também tem sua culpa no cartório dessa destruição. Alimentadas sempre nas mesmas flores, as abelhas adquirem uma espécie de mortal “anemia”. E como se uma criança só comesse chuchu,  nada mais.
É triste. Dizem que Einstein afirmava que a humanidade morreria se morressem as abelhas. Ele, talvez, soubesse melhor que ninguém sobre o jogo de vibrações que une o universo. Um circuito múltiplo de forças em que nem um só elo pode ser corrompido.
Diante disso tudo, soa irônica a fala que  Shakespeare, em “A tempestade”, uma das suas peças, põe na boca de Miranda, a filha de Próspero, o Mago: “Ó maravilha! Quantas criaturas adoráveis existem aqui! Quão belos são os humanos! Ó admirável mundo novo, onde habitam semelhantes pessoas!”.
Deliciosas palavras. Mas que, a meu ver, bem melhor que aos humanos, se aplicariam às abelhas!




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